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O meu percurso low FODMAP

Nos últimos anos tenho partilhado por aqui o meu percurso com a alimentação de base vegetal. Em 2025, a minha vida deu uma nova volta: depois de vários sintomas gastrointestinais e do diagnóstico de endometriose, iniciei o protocolo low FODMAP.

Decidi criar esta página porque recebo muitas perguntas sobre o que me levou a fazer este protocolo, o que mudou e como estou a adaptar (e vou continuar a adaptar) as minhas refeições daqui para a frente.

Quero que este seja um espaço transparente, onde partilho a minha experiência pessoal e real com:

  • os desafios,

  • as aprendizagens,

  • e as soluções que fui encontrando.

⚠️ Esta é a minha história. Quero reforçar que o protocolo low FODMAP deve ser sempre recomendado por um médico e acompanhado em todas as fases por um nutricionista certificado.

 

O que me levou ao low FODMAP

Tudo começou em 2024, depois de um episódio de dor menstrual aguda que me acordou a meio da noite e me fez rastejar até à gaveta dos comprimidos.

Após mais alguns episódios de dor intensa, decidi marcar uma consulta no Hospital da Luz, em Lisboa, com o ginecologista e especialista em endometriose Dr. João Sequeira Alves.

Depois de alguns exames, veio a confirmação da suspeita: endometriose. Com este diagnóstico, o médico recomendou-me acompanhamento nutricional.

Foi nessa fase que pedi recomendações no Instagram e conheci a minha atual nutricionista, a Mafalda Esteves. Ainda assim, só no início de 2025 é que decidi finalmente marcar a primeira consulta.

Nesta fase já sentia que estava a engordar (sobretudo na zona da barriga) e associava sempre ao ciclo menstrual. As calças deixaram de me servir e, muitas vezes, quando estava sentada precisava abrir o botão para aliviar o desconforto. Mas nunca fiz a ligação com questões gastrointestinais.

Com estes sintomas, a minha nutricionista fez alguns ajustes na alimentação, mais direcionados para uma vertente anti-inflamatória.

Após revermos a suplementação (com base em análises clínicas) e passados dois meses de mudanças alimentares, os sintomas não melhoraram. Pelo contrário: tudo piorava na fase lútea (entre a ovulação e a menstruação). Cheguei a sentir que nada me servia, não conseguia apertar as calças e ficava inchada até com água. E pensava: “Se eu como tão bem e saudável, porque é que estou assim?”

Foi então que a Mafalda me disse: “Vânia, vamos experimentar low FODMAP. Suspeito que tenhas aqui alguma intolerância ou sensibilidade.”

E assim foi: no final de junho de 2025 dei início ao protocolo.

 

O que é o protocolo low FODMAP

O protocolo low FODMAP não é uma dieta da moda, mas sim uma abordagem criada pela Monash University. Foi desenvolvido sobretudo para pessoas com síndrome do intestino irritável (SII) e outros distúrbios gastrointestinais funcionais, em que sintomas como inchaço, dor abdominal, gases ou alterações do trânsito intestinal são frequentes.

FODMAP é o nome dado a um grupo de hidratos de carbono fermentáveis que, em algumas pessoas, não são bem absorvidos e podem causar sintomas (podes ver melhor explicado neste vídeo). Estes hidratos estão presentes em muitos alimentos comuns do dia a dia: frutas, vegetais, leguminosas, lacticínios, cereais e até adoçantes.

O protocolo é temporário e tem três fases:

1. Restrição/eliminação: reduz-se o consumo de alimentos ricos em FODMAP durante 4 a 6 semanas.
2. Reintrodução/teste: testa-se um grupo de cada vez (frutose, lactose, frutanos, etc.) para perceber o que causa sintomas, num período de cerca de 11 a 12 semanas.
3. Personalização: adapta-se a alimentação a longo prazo, incluindo novamente o máximo de alimentos tolerados.

Não é um protocolo indicado para todos nem deve ser seguido sem orientação profissional. O objetivo não é “excluir alimentos para sempre”, mas sim identificar quais sãos os grupos de FODMAP e/ou alimentos que causam os sintomas e personalizar a alimentação de forma equilibrada a longo prazo.

A minha experiência na prática

Começar o protocolo não foi nada fácil. Confesso que me senti completamente assoberbada no início.

Na teoria parece simples: existe uma lista de alimentos baixos em FODMAP e outra com alimentos altos em FODMAP, com as doses indicadas para cada um. É só seguir isso. Mas na prática… não é assim tão linear.

O desafio é ainda maior para quem segue uma alimentação de base vegetal. Quase todos os alimentos vegetais contêm algum tipo de FODMAP e é muito fácil acumular numa só refeição, o que dificulta o processo. Por isso, a fase 1 foi sem dúvida a mais difícil para mim.

A fase 1

Durou quase 6 semanas. Mas logo nas primeiras duas comecei a sentir o meu corpo (literalmente) a desinchar.

Depois dessas semanas a viver apenas de tofu, tempeh, ovos. E quase todas as leguminosas que tentava comer, mesmo nas doses recomendadas, davam-me gases e desconforto abdominal. Foi aí que tive de tomar a difícil decisão de voltar a comer peixe.

Continuava a treinar, estava a perder peso e comer apenas ovos, tofu e tempeh como fonte proteica não estava a funcionar.

Depois de 10 anos sem comer peixe, não foi fácil tomar esta decisão. A verdade é que o meu corpo voltou a aceitar bastante bem essa proteína e sem qualquer sintoma gastrointestinal.

Foi também no final desta fase que surgiu a ideia de criar o guia da digestão tranquila, onde pudesse registar e partilhar as receitas que me acompanharam neste processo.

A fase 2

Se na fase 1 os sintomas ficaram controlados, na fase 2 enfrentei um novo desafio – e também algum medo: o de voltar a sentir desconforto. Nesta fase, fui reintroduzindo de forma estratégica um alimento de cada grupo de FODMAP, sempre com acompanhamento profissional.

É mesmo importante seguir o protocolo à risca e, acima de tudo, escutar os sinais do corpo. É uma das fases mais exigentes, mas também das mais reveladoras.

❌ Os alimentos/grupos que causaram sintomas e se revelaram gatilhos para mim:

  • Frutanos da cebola: (sintomas na 3ª dose)
  • Frutanos do trigo: (sintomas na 1ª dose)
  • Frutanos hortofrutícolas: alho francês (sintomas na 2ª dose)
  • Galactanos: tofu suave (sintomas na 1ª dose)
  • Frutanos + galactanos: caju (sintomas na 3ª dose)
  • Frutanos do alho: (sintomas na 1ª dose)

✅ Os alimentos/grupos que não causaram sintomas:

  • Frutose: manga
  • Lactose: iogurte grego
  • Sorbitol: alperce
  • Manitol: cogumelos portobello
  • Frutose + sorbitol: maçã

A fase 3

Ainda não iniciei a fase 3, mas sei que é a etapa onde tudo começa a fazer mais sentido. Depois da restrição e da reintrodução, esta fase serve para personalizar a alimentação a longo prazo, incluindo novamente todos os alimentos que o corpo tolera bem.

O objetivo é voltar a ter uma alimentação o mais variada possível, sem sintomas, mas com clareza sobre o que pode ser um gatilho e em que quantidades.

Neste momento continuo em fase de testes, mas estou confiante de que esta última etapa vai ajudar-me a encontrar um equilíbrio mais estável, sempre respeitando as minhas necessidades, o meu corpo e o meu estilo de vida.

Perguntas frequentes

Se estás a ouvir falar do low FODMAP pela primeira vez, talvez tenhas algumas destas dúvidas.
Aqui ficam as respostas, baseadas na minha experiência e no acompanhamento que estou a fazer.

Que sintomas tinha e como percebi que não eram normais?

Os primeiros sinais foram as dores menstruais intensas e incapacitantes. Nessa fase, associava o desconforto apenas às alterações hormonais e a momentos específicos do meu ciclo menstrual.

Com o tempo, e já em acompanhamento com a minha nutricionista, comecei a perceber que havia outros sinais que não eram “normais”: sentir que estava a “engordar” apenas na zona da barriga, ter de abrir o botão das calças sempre que me sentava, sentir inchaço abdominal constante, dores e desconforto que já não apareciam só na menstruação, mas se prolongavam noutras fases do ciclo.

Foi ao registar o meu ciclo e observar padrões que percebemos que havia algo mais para além das questões hormonais, e que provavelmente eu já estava a viver com questões gastrointestinais há mais tempo, mas nunca tinha feito a ligação.

Afinal, depois de 10 anos a seguir uma alimentação vegetariana e tão cuidada, nunca pensei que pudesse ter problemas digestivos.

Foi neste contexto, e com a experiência clínica da minha nutricionista, que começou a surgir a hipótese de SIBO ou de sensibilidade aos FODMAP, algo que eu, até então, nunca tinha considerado.

Colocaram-te a hipótese de SIBO?

Sim. Quando comecei a registar os sintomas e a trabalhar com a minha nutricionista, percebemos que havia padrões que iam para além das dores menstruais. O inchaço abdominal constante, o desconforto e a sensação de que nada me servia levantaram a dúvida: seria apenas uma sensibilidade aos FODMAP ou poderia tratar-se de SIBO (Small Intestinal Bacterial Overgrowth)?

No meu caso, decidimos começar pelo protocolo low FODMAP porque era a estratégia mais adequada naquele momento, tendo em conta a minha história clínica, os sintomas e a alimentação que já fazia.

O SIBO é uma condição clínica que deve ser diagnosticada e acompanhada por um médico, geralmente através de testes específicos (como o teste respiratório). O tratamento pode envolver antibióticos ou antimicrobianos prescritos, em conjunto com ajustes alimentares feitos por um nutricionista. O protocolo low FODMAP pode ser usado em alguns casos para aliviar sintomas, mas por si só não trata o SIBO.

No meu caso, apesar de a hipótese ter sido levantada, não cheguei a avançar para exames nem tratamento, porque a melhoria rápida com o protocolo low FODMAP afastou essa possibilidade.

Colocaram-te a hipótese SII?

Essa foi outra hipótese que também surgiu. A Síndrome do Intestino Irritável (SII) é uma condição funcional comum, em que não há alterações visíveis nos exames, mas existem sintomas como dor abdominal, gases, diarreia ou obstipação (é um diagnóstico por exclusão).

O protocolo low FODMAP foi inicialmente desenvolvido precisamente para pessoas com SII, porque ajuda a identificar quais os alimentos que desencadeiam sintomas.

No meu caso, apesar de alguns sintomas serem semelhantes, e poder ter algum grau de SII o meu diagnóstico principal é de endometriose, que por si só pode provocar sintomas digestivos e aumentar a sensibilidade intestinal. Por isso, o protocolo low FODMAP foi recomendado como ferramenta para perceber melhor os meus gatilhos alimentares, mas não cheguei a ter um diagnóstico formal de SII.

O protocolo low FODMAP recomenda-se a todas as pessoas?

Não. O protocolo low FODMAP não é para todas as pessoas e muito menos é uma abordagem para emagrecimento. Foi desenvolvido sobretudo para pessoas com síndrome do intestino irritável (SII) ou outros distúrbios gastrointestinais funcionais, e deve ser sempre feito com acompanhamento médico e nutricional.

É um processo exigente, que implica retirar muitos alimentos da rotina durante algumas semanas. Quando não é acompanhado por um profissional de saúde, pode trazer riscos a longo prazo, como distúrbios alimentares e até alterações na microbiota intestinal.

No meu caso, comecei este protocolo por recomendação da minha nutricionista, depois de meses a observar padrões e sintomas que não melhoravam com ajustes alimentares comuns.

É para seguir para sempre ou é temporário?

O protocolo low FODMAP é temporário. Não se trata de uma forma de comer para a vida toda, mas sim de uma ferramenta para identificar quais os alimentos que desencadeiam sintomas gastrointestinais.

Divide-se em três fases:

  1. Restrição: durante algumas semanas reduzem-se os alimentos ricos em FODMAP.
  2. Reintrodução: testa-se cada grupo de FODMAP para perceber a tolerância.
  3. Personalização: adapta-se a alimentação a longo prazo, voltando a incluir o máximo de alimentos tolerados.

O objetivo final é sempre ter uma alimentação variada e equilibrada, sem sintomas, e não viver eternamente em restrição.

No meu caso, ainda estou na fase 2 (reintrodução), mas já percebi alguns gatilhos e comecei a ganhar clareza sobre os alimentos que consigo incluir sem problemas.

É possível fazer low FODMAP numa alimentação vegetariana?

É possível sim, e há quem o faça (mesmo numa alimentação 100% vegetal), mas não é fácil. A maior parte dos alimentos de origem vegetal, como: leguminosas, oleaginosas, cereais, frutas e vegetais. Contém FODMAPs, o que torna tudo ainda mais desafiante.

No meu caso, essa foi uma das maiores dificuldades na fase 1. Mesmo respeitando as doses recomendadas de leguminosas, continuava a sentir gases e desconforto. Foi aí que tive de tomar a difícil decisão de reintroduzir o peixe, depois de mais de 10 anos sem o consumir, para garantir variedade e equilíbrio nutricional.

Foi uma escolha minha, mas sinda assim, continuo a fazer uma alimentação maioritariamente de base vegetal, com muitos vegetais, frutas permitidas, cereais, ovos, tofu e tempeh. O importante é perceber o que funciona para cada corpo e adaptar a alimentação de forma realista.

Onde posso encontrar informações e artigos científicos sobre o protocolo?

A principal fonte de informação sobre o protocolo low FODMAP é a Monash University, na Austrália. Foi lá que este protocolo foi desenvolvido e continua a ser estudado. Eles têm uma aplicação oficial (Monash FODMAP App), atualizada regularmente, com listas de alimentos testados e artigos baseados em evidência científica.

Também existem outros centros de investigação que publicam sobre o tema, mas a Monash continua a ser a referência mundial.

No meu caso, além de acompanhar as atualizações da Monash, sigo sempre as orientações da minha nutricionista, que adapta as recomendações científicas à minha realidade.

Posso encontrar receitas e recursos low FODMAP no Made by Choices?

Sim. Apesar de o Made by Choices ter nascido e crescido com foco na alimentação de base vegetal, esta nova fase levou-me também a criar recursos adaptados ao protocolo low FODMAP.

Encontras no site:

Este é um processo em evolução, e à medida que vou aprendendo e experimentando, vou partilhando mais conteúdos para ajudar quem está a passar pelo mesmo caminho.

Nota final

Quis partilhar o meu percurso com o protocolo low FODMAP porque sei o quão desafiante pode ser viver com sintomas gastrointestinais e sentir que, muitas vezes, não há respostas claras.

Este processo tem sido feito de altos e baixos, de aprendizagens e de decisões difíceis – mas também de alívio, descoberta e reconexão com o meu corpo.

Quero reforçar que esta é apenas a minha experiência pessoal. Cada corpo é único e o protocolo deve ser sempre acompanhado por profissionais de saúde.

Se estás a passar por algo semelhante, espero que encontres aqui inspiração, companhia e, sobretudo, a certeza de que não estás sozinho/a neste caminho. 🌿